A responsabilidade administrativa ambiental na visão do STJ

Três são os tipos de responsabilidade a que estão sujeitos os poluidores na esfera do Direito Ambiental .  A civil, a administrativa e a penal.

A responsabilidade civil, não há dúvidas, é objetiva. A responsabilidade criminal, em outro extremo, é subjetiva. Já a responsabilidade administrativa é aquela que revela contornos mais delicados e cuja natureza tem sofrido maiores discussões nos últimos tempos.

O recente movimento observado nos julgados proferidos pela Primeira Seção do  STJ (1ª e 2ª Turmas), que é a responsável por julgar a matéria ambiental no plano infraconstitucional, indicam uma forte tendência em classificar a responsabilidade administrativa ambiental como subjetiva.

Matéria publicada no site CONJUR em 05.03.2019

Inegável a importância do tema, pois as multas aplicadas podem chegar a patamares altíssimos. Isso sem que se considere que a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados aprovou em 2018 o PL 5067/16, para majorar o limite máximo das multas por infrações ambientais dos atuais R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) para R$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões de reais).

Na 1ª Turma[1] prevalecia o entendimento de que a responsabilidade por infrações administrativas ambientais seria objetiva, enquanto que a 2ª  Turma[2] entendia que as infrações administrativas ambientais estariam sujeitas ao regime de responsabilidade subjetiva.

Na 2ª turma, onde a situação já está consolidada, podem ser destacados os seguintes julgamentos: REsp. 1.251.697-PR, julgado em 12.04.2012 e REsp. 1.401.500 – PR, julgado em 16/08/2016.

Esse cenário de divergências começou a se modificar em 18 de junho de 2015, por ocasião do julgamento do AgRg no Agravo no Recurso Especial Nº 62.584-RJ, ocasião na qual a 1ª Turma do STJ mudou o posicionamento anterior e assentou novos rumos na premissa de que:  a responsabilidade civil por dano ambiental é mais abrangente do que a responsabilidade administrativa e penal, não admitindo estas últimas que terceiros respondam a título objetivo por ofensas ambientais praticadas por outrem“:

AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 62.584 – RJ (2011/0240437-3)

RELATOR  : MINISTRO SÉRGIO KUKINA R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA REGINA HELENA COSTA AGRAVANTE        : IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S/A ADVOGADO      : SÉRGIO LUIZ SILVA E OUTRO(S) AGRAVADO          : MUNICÍPIO DE GUAPIMIRIM

ADVOGADO    : ZULMIRA TOSTES E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO E PROCESSUA CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL, ACIDENTE NO TRANSPORTE DE ÓLEO DIESEL. IMPOSIÇÃO DE MULTA AO PROPRIETÁRIO DA CARGA. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA.

  1. A corte de origem apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando a tese vertida pela parte ora Agravante. Inexistência de omissão.
  2. A reponsabilidade civil ambiental é objetiva; porém, tratando-se de responsabilidade administrativa ambiental, o terceiro, proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo transportador.
  3. Agravo regimental provido.

O que se observa, pois, é que à partir da decisão  acima evidenciada as duas Turmas da 1ª Seção do STJ passaram a ter pronunciamentos no sentido de  que a responsabilidade administrativa ambiental teria natureza subjetiva.

Ocorre que na 1ª Turma essa posição ainda não é unânime e tal fato, ao que parece, se deu ante a divergência havida em votos de dois ministros convocados para a vaga que pertenceu ao Ministro Teori Zavascki.

Melhor explicando, em 2015, a  1ª Turma contava com dois ministros que votavam pela responsabilidade objetiva, Ministro Benedito Gonçalves e Ministro Sergio Kukina e dois outros ministros adotavam a tese de que a responsabilidade administrativa ambiental seria subjetiva, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho e Ministra Regina Helena Costa.  O voto de minerva era sempre dado pelo magistrado convocado.

Em 17/03/2015, nos autos do  REsp 1.318.051, a Juíza Federal convocada Marga Tessler entendeu que a responsabilidade administrativa ambiental  seria objetiva e essa foi a tese vencedora.

Já em 18/06/2015, nos autos do REsp 62.584/RJ, o Desembargador convocado, Olindo Menezes, votou no sentido de que a responsabilidade administrativa por infrações ambientais seria subjetiva e esta, então, foi a tese vencedora.

Visando unificar a jurisprudência da Corte, em vista da divergência acima enunciada,  serão julgados os embargos de divergência nº 1.318.051-RJ.

Desse julgamento participará o Ministro Gurgel Farias, que em 01/03/2016 assumiu em definitivo a cadeira de Ministro da 1ª Turma do STJ e será dele um dos votos que irá sedimentar a posição da Turma e decidir a divergência.

Nesse sentido, importante observar que o Ministro Gurgel Farias já se manifestou sobre o tema em análise adotando a tese da responsabilidade subjetiva.

Em voto proferido no dia 28/05/18 no REsp 1.443.173 – PB, o Ministro Gurgel Farias demonstrou que é partidário da corrente que pensa a responsabilidade administrativa ambiental de forma subjetiva:

“Nas razões do especial, o IBAMA defende que a responsabilidade, no direito ambiental, é objetiva e independe da demonstração de culpar por parte do infrator.

Ocorre que esta Corte de Justiça tem entendido que, no campo do direito ambiental, “a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação  dos  danos  causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria  da  culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado  transgressor, com demonstração de seu elemento subjetivo, e com  demonstração  do  nexo  causal entre a conduta e o dano” (REsp 1401500/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 13/09/2016).

A esse respeito:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL. ACIDENTE NO TRANSPORTE DE ÓLEO DIESEL. IMPOSIÇÃO DE MULTA AO PROPRIETÁRIO DA CARGA. IMPOSSIBILIDADE. TERCEIRO.

RESPONSABILIDADE SUBJETIVA.

I – A Corte de origem apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando a tese vertida pela parte ora Agravante. Inexistência de omissão.

II – A responsabilidade civil ambiental é objetiva; porém, tratando-se de responsabilidade administrativa ambiental, o terceiro, proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo transportador.

III – Agravo regimental provido.

(AgRg no AREsp 62.584/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/06/2015, DJe 07/10/2015)”

A tendência, portanto, considerando-se que  a posição da 2ª Turma já se encontra sedimentada e  a se confirmar a  mudança de rumo da inteligência da 1ª Turma, é que se estabilize no STJ o entendimento de que a responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva.

Gustavo Barbosa Godoy é advogado especializado em Direito Ambiental, sócio fundador da Godoy & Godoy Advogados Associados.

Matéria publicada no site Migalhas Jurídicas em 25.01.2019 e no site CONJUR em 05.03.2019


[1] Composta pelos Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa e Gurgel de Faria.

[2] Composta pelos Ministros Herman Benjamim, Mauro Campbell Marques, Francisco Falcão, Og Fernandes e Assusete Magalhães